Blogue

VERDES ANOS. 15

04-09-2015 12:56

Ensino do Português e Latim[1]

 

No número de Novembro de 1952 deste Boletim, o amigo da língua portuguesa, Sr. Dr. Hernâni Dias da Silva, publicou um tão raro, entre nós, como notável e meritório breve estudo sobre os verbos auxiliares. Raro, notável e meritório pelos caminhos que toma e pelos resultados a que chega. Reconhece na nossa língua, além de «ter», «haver» e «ser», outros verbos auxiliares, os quais encerram acção futurível, segundo vários modos que atentamente discrimina. Surpreende-se o leitor ao verificar que, nas notas ao seu trabalho, o autor não utiliza exemplos extraídos da língua francesa, mas sempre compara com o inglês e o alemão; mas logo cai da sua surpresa ao reconsiderar que a lista gramatical dos verbos auxiliares, se tem permanecido limitada, é porque os linguistas têm insistido em elaborar a gramática portuguesa pelo modelo da francesa. É certo que, hoje, quase todos os linguistas reconhecem os malefícios do comércio idiomático com a França, mas, na sua maior parte, limitam-se a denunciar e combater o galicismo do morfema. No domínio da sintaxe, quanto à ordenação dos elementos fundamentais da oração, introduzem alguns o justo reparo de que constitui, quase sempre, um galicismo sintático a sequência «sujeito-predicado-complemento». De facto, se uma oração se relaciona com a ventura, como nomear a série «sujeito-predicado-complemento», já de si fechada, e em que o elemento médio é, na língua francesa, essencialmente tempo presente, visto como o que é perfeito, por definição, não seja futurante? Também a ordenação das preposições, no período francês, que é rectilínea disposição de sentenças rectas, não dá perspectivas, pois não resulta da interferência de planos diversos. O carácter dos elementos vem a participar do carácter do discurso. E assim o galicismo que mais importa combater é o estilístico, pois dele resulta o total anquilosamento e a inteira alienação da alma pensante.

Justamente, porém, se orgulham os Franceses do seu idioma. Na abundância de partículas concisas, na precisão do período, curto e claro, na composição enquadrante, exacta do discurso, tem o francês as condições necessárias de inigualável delineação de quadros descritivos. Mas não deixa de ser prematura e prejudicial a sujeição a seus moldes de qualquer outro idioma que, na imprecisão e no capricho, sinala irrealização de virtudes, se não exprime verdades indescriptíveis. Se a ordem lógica da verdade é outra, outra terá de ser a ordem verbal que a exprime. E assim a língua portuguesa, nos escritores seus verdadeiramente representativos, do latim herda a expressão das substâncias eternas e de si cria as relações pelas quais age no tempo futurante a eternidade das substâncias.

Os escritores genuínos da língua portuguesa mostram vincados vestígios de demo-rada convivência com a língua virgiliana. Pelo contrário, o jornalismo, formado pelos apressados escritores de «todos os dias», contempla, boquiaberto e sonambúlico, os mode-los que da França nos traz quotidianamente o Sud-Express.

 Aqui, porém, urge que paremos e reparemos.

Apontamos o mal que nos vem de ser a gramática portuguesa construída sobre a francesa. Paralelamente concorre para mal idêntico o ensino do latim, entre nós, pelo modelo do ensino do latim entre os franceses. No liceu, o ensino do latim é o ensino de o traduzir. Quem queira consultar a Traduction du Latin, de Marouzeau, ou quem rememore o método usado para levar a cabo uma tradução, verá como consiste em rectificar o labirinto sintático que o texto original oferece. Para tanto, importa, quanto ao período, colher primeiro a oração principal, e em seguida as coordenadas e as subordinadas; quanto à oração, encontrar o predicado, e em seguida o sujeito e os complementos. Posto cada termo no lugar que lhe cabe na construção sintática francesa, achada está a tradução. Deste modo, o latim, em vez de, como língua que é originante da nossa, nos possibilitar uma bela e original redacção do português, serve de instrumento para, com o idioma pátrio, escrevermos francês. Todos nós que um dia aprendemos latim nos surpreendemos a interrogar como se compreenderiam entre si os romanos, tal o hábito do pensamento sem curvas, simples e correntio. Métodos ingleses, todavia, abundam que ensinam a traduzir o latim sem saltos, à medida que se vai lendo, seguindo, embora com esforço, mas com surpresa e emoção, o curso labiríntico do pensamento. Consoante este processo de leitura, será depois, como é óbvio, a tradução redigida, e, o que mais importa, redigida consoante o português será, no momento em que o escritor defronta o próprio pensamento.

Estamos agora na ocasião propícia de sugerir que, no liceu, o ensino do português seja ministrado apenas pelos licenciados em filologia clássica. Mas para que a recta intenção não seja ludibriada, convém que o latim seja ensinado por método diferente do que vigora, método de acordo com as directrizes que sugerimos.

Em Les Nouvelles Littéraires de 6 de Novembro do corrente ano, lemos de Gabriel Marcel este apontamento: «Le problème de la traduction française en ce qui concerne Shakspeare doit être regardée comme à peu près insoluble. Bien sûr, on peut toujours retenir le sens, mais neuf fois sur dix la musique disparait». No mesmo número, Francis de Niormande, numa coluna dedicada, como de costume, à língua francesa, escreve: «Aucune erreur ne resiste à une phrase française bien faite; ou, plus exactement, il est impossible d'exprimer dans une phrase juste une pensée elle-même contrefaite. Cette épreuve est infaillible. Les ideologies plus ou moins fumeuses elaborées par des cerveaux mal équilibrés ne peuvent être dénoncées que dans un affreux jargon. Et les voilà jugés par le fait même». Estas duas citações, especialmente a segunda; vêm confirmar, ex ipsa origine, o que hemos dito. Consoante, em frases bem feitas, declara o jornalista francês, a sua língua é eminentemente disciplinar. Nela a razão encontrou o idioma próprio. E o fantasioso, desequilibrado Shakespeare logo se torna prosaico e sisudo, quando traduzido para francês. Não é admirativa a nossa subserviência à língua estranha. Mais do que isso, se não por inteiro, há o intuito agido de, à disciplina da língua que reúna as referidas condições, um povo imperfeito submeter, precisamente porque, porque imperfeito, busca na aventura da língua aquela remota palavra perdida que os lábios de Deus pronunciaram. Não o negamos. Na verdade, ao pensamento matemático nenhuma língua o exprime tão perfeitamente como a francesa. Língua perfeita, é, por isso mesmo, apta como nenhuma para as grandes sínteses historiográficas. Como nenhuma, é, por isso mesmo, tão inapta para a profecia.

 

António Telmo



[1] A Bem da Língua Portuguesa, ano IV, n.º 1, Lisboa, Jan. 1953, pp. 6-7.

 

 

INÉDITOS. 56

02-09-2015 09:04

Por volta de 1993, António Telmo e alguns membros do seu círculo procuraram dar corpo ao projecto de uma revista que esteve para se chamar Portugal. O Encoberto e Átrio foram outros nomes possíveis desta publicação. O ensejo gorou-se, mas o texto de “Apresentação”, escrito e assinado pelo filósofo, ficou. Mais tarde, num período que presumivelmente se situará entre 1998, ano da iniciação maçónica de Telmo, e 2000, ano do começo da publicação da revista Teoremas da Filosofia, o filósofo parece ter querido recuperá-lo para uma outra publicação, afecta ao movimento da Filosofia Portuguesa. O dado novo mais significativo deste recomeço, também frustrado, parece, porém, ser a inspiração maçónica que António Telmo pretendia conferir ao novo projecto. Ao título inicial, dactilografado, acrescentará pelo seu próprio punho os seguintes dizeres: “a Oriente de Estremoz de uma revista literária”... 

Apresentação a Oriente de Estremoz de uma revista literária

 

"É o começo que falta ao homem. Encontrá-lo não é difícil; o obstáculo é imaginar que se é obrigado a procurá-lo."

Gustavo Meyrink

 

O domínio intelectual de Lisboa e de Coimbra sobre o país, através da Universidade fundada pelo rei poeta, que perdurou e se intensificou no decurso dos séculos, tem funcionado, sobretudo a partir do Marquês de Pombal, como um meio de recepção, de adaptação e de propagação das ideias estrangeiras e de formação de juristas políticos, hoje também de engenheiros, que as utilizam na governação do povo. O movimento que se desencadeou no Norte, partindo de Sampaio Bruno, com dois exércitos perfeitamente harmónicos, o da Renascença Portuguesa e o da Filosofia Portuguesa, tentou, por entre reacções ferozes, a reconquista espiritual da Pátria. No seu discurso parlamentar sobre "A Questão Universitária", o filósofo iluminado Leonardo Coimbra, fundador da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, disse assim:

 

A força de inércia ou coesão das associações é a grande força conservantista das sociedades, é como uma memória social implícita, hipnótica, parente dos instintos animais. Pertence à massa ignara. A força de dissociação e criação de novas associações pertence, singular e esporadicamente, aos génios; pertence sistematicamente aos organismos intelectuais superiores, que são a parte lúcida e criadora da consciência colectiva. Nesses organismos contam, desde o século XII, as Universidades.

As Universidades são, pois, grandes factores de evolução da crença. E assim é que sempre que um bando tenta impor uma crença, adormecer o espírito humano num dado associacionismo psíquico, esse bando vai à conquista das Universidades. É deste modo que a um período de esplendor da Universidade portuguesa segue, com D. João III, a conquista pelos jesuítas do colégio das artes e depois a confirmação da Universidade de Évora, sendo obrigatório o curso do colégio das artes para a matrícula na velha Universidade, e vindo a conseguir que os jesuítas graduados em qualquer Universidade fossem como graduados na Universidade de Coimbra.

 

Os dois primeiros discípulos de Leonardo Coimbra, José Marinho e Álvaro Ribeiro, e o décimo terceiro, Agostinho da Silva, logo após a morte do Mestre, trouxeram até à capital física do outrora Império do mundo o movimento da reconquista. O Alentejo, que recentemente viu reformulada nos moldes coimbrões a Universidade de Évora, manteve-se, desde a implantação da República, distante e alheado da guerra santa, constituindo uma zona desértica ou de "armamento" espiritual. Não é, pois, um acaso, o facto desta revista ter como sede a cidade alentejana de Estremoz.

Durante a ocupação de Portugal pelas tropas do duque de Alba, quando se constituiu aqui um governo de portugueses ao serviço do rei de Espanha, os alentejanos saíram e foram formar o Brasil. Jaime Cortesão conta-nos como isso foi na sua Introdução à História das Bandeiras. Enquanto a América espanhola nasceu dos "aldeamentos" organizados pelos jesuítas que, entre os seus muros, submetiam os índios vencidos a uma rigorosa disciplina, a América portuguesa foi feita pela aliança dos índios e dos portugueses, que traçaram o mapa do Brasil com os pés, por vales e montanhas. Os alentejanos foram capazes de tal proeza por estarem habituados a longas caminhadas atrás das perdizes até as cansarem. O verdadeiro "começar" não é, porém, sair, embora seja preferível fazê-lo a ficar escravo e, sobretudo, quando se imagina transplantar para longe a Pátria, criando-a de novo ali.

O rio Tejo é o diafragma de Portugal. Se nos representarmos o país na figura do Homem, o Alentejo aparece-nos em baixo, sob esse diafragma, cindido, na sua vagarosa digestão dos alimentos da terra, da vida superior do Espírito, que mora no Porto e no Marão. Estabelecer nele um foco de domínio material pelas ideias foi o que esteve na mente dos fundadores da Universidade de Évora. O Norte, intelecto e princípio da Pátria, já isolado no próprio corpo que superiormente inspira pela torácica acção das zonas de recepção e de projecção das influências exteriores, dificilmente poderá fazer-se sentir no Alentejo e no Algarve. Pensamos ter chegado o momento de aqui levantarmos um Castelo de irradiação espiritual. A antiga relação, hoje desfeita, com o pensamento islâmico e judaico encontrará assim, actualizado, um meio de reanimação. A profunda afinidade, outrora existente, entre as filosofias esotéricas de Prisciliano, no norte galaico, e de Ibn Qasi, mestre de Ibn Arabi, no Algarve, assume, através dele[1], a força de um símbolo.

Deve-se à operatividade intelectual de árabes e judeus o conhecimento pela Europa de Aristóteles e Platão. Há uma escolástica hebraica e uma escolástica islâmica, antes ainda de uma escolástica cristã. As três tradições conviveram harmoniosamente até D. Afonso, em terra portuguesa. O Alentejo e o Algarve eram então zonas de profunda irradiação da sabedoria filosófica.

Compreende-se assim porque escolhemos para capa da revista a Rebis alquímica, tal como a concebeu Rafael na figura dos dois filósofos gregos. Segundo Tomé Natanael, nosso mestre, Rafael não pintou a oposição de Aristóteles a Platão. O que, na verdade, ali está é o seguinte: a energia celeste é captada pelo dedo indicador de Platão, dirigido ao alto em ponta, e a energia terrestre pela palma da mão de Aristóteles, voltada para baixo paralelamente ao chão; as duas correntes de energia espiritual combinam-se no ponto que, na alma, corresponde ao encontro dos dois olhares e constituem-se numa terceira de que teremos a revelação perfeita quando os dois filósofos, que vêm andando para nós, descerem os quatro degraus da história.

A Escola de Atenas, pintada por Rafael, aparece-nos como o excelso modelo do ensino acroamático, proposto à nossa imitação hoje sobretudo em que o ensino para toda a gente, de louváveis intenções e de sinistros fins, pretende, não a vida do Espírito, mas adestrar os "escravos" com a instrumentação cultural indispensável para servirem, contentes e iludidos, a sociedade tecnológica. Quem a pode ter por ideal são as tertúlias. As tertúlias é que constituem autênticas escolas de ensino particular ou acroamático. E é por isso que o problema da legitimidade do ensino particular que é, afinal, o da liberdade de ensinar, tal como é posto habitualmente, se deve ou não ser reconhecido e autorizado pelo Estado, é um falso problema. Ensino público apenas para o Estado. Ao público as tertúlias chegarão pelos livros e pelas revistas.

O que hoje sabemos ter distinguido a Faculdade de Letras da Universidade do Porto, extinta por Salazar, dos outros organismos estaduais de ensino foi duas coisas: a acção directora de um homem de génio, Leonardo Coimbra, e o facto de coexistir com ela uma tertúlia. Conforme a indicação de Álvaro Ribeiro: «A Faculdade de Letras da Universidade do Porto constituiu o exemplo de como uma associação secreta pode funcionar aberta ao público.»

O funcionamento de uma tertúlia activa e criadora depende da existência de uma tradição sófica, isto é, aquilo que a garante como verdadeira é a presença de quem continue a cadeia formada por sucessivas gerações de mestres e discípulos vivendo a mesma doutrina esotérica. Este é o caso das tertúlias de filosofia portuguesa, que foi fundada por Sampaio Bruno no ano em que, com trinta e seis anos, publicou as Notas do Exílio, vindo de Paris, onde terá recebido a iniciação no martinismo. A revista Leonardo foi a expressão actual de uma delas e constitui um foco de irradiação espiritual em Lisboa.

O que distingue a revista de outras é a identificação da arte de filosofar com a arte poética. Aparece, pois, como uma publicação em que predominam o conto, o poema, o ensaio, o aforismo. Sabemos que a razão não convence ninguém, se não falar aos sentimentos. O perigo que nos espreita é o da adulteração da filosofia pela literatura.

 

António Telmo



[1] Nota do editor – António Telmo grafa entre parêntesis manuscritos, seguidos de um ponto de interrogação também manuscrito, a expressão “através dele”.

 

CORRESPONDÊNCIA. 28

31-08-2015 12:16

CARTAS DE ANTÓNIO TELMO PARA ANTÓNIO CÂNDIDO FRANCO. 09

 

Estremoz

6-3-90

 

Estimado Amigo

 

Recebi o seu livro. Há dias enviei-lhe, pelo João Rêgo, o que me tinha pedido de Joseph de Maistre. Recebi a sua carta. Fiquei contente da sua vinda para Évora. Quando? Não mo diz. Claro que terei muito gosto em jantar consigo.

Há quinze dias que convivo com o seu espírito. Puseram à venda, na tabaqueira de Estremoz, um exemplar do seu livro para mim. A alma, tranquila, cristalina corrente tem a ressonância de um ritual [vitral?] na minha alma. Amo tudo no seu livro: a perfeita atenção e memória do mundo exterior acompanhadas, o saber subtil do pequeno, o convívio esotérico com a natureza e os seus segredos, a visão física de Inês pelo seu nome, a funda e certa reflexão sobre o sentido da História de Portugal. Pasma-se. António Cândido Franco, Mestre de Avis da Filosofia Portuguesa.

Há momentos em que se nos revela a perfeita Beleza. Por exemplo: a maçónica reflexão de Hirão em Mira.

Desde criança de dez anos em Arruda dos Vinhos que tenho sonhado escrever o que Shakespeare escreveria sobre Pedro e Inês. Tantos o têm tentado em vão, até o Vítor Hugo da mesma idade. É, porém, um caso que, em si, é tão perfeitamente significativo que nada é deixado à ideação do indivíduo que pretende descrevê-lo. Daqui o insucesso dos grandes espíritos que o tentaram. V. olhou e contou. Limitou-se a ver e a sentir e pensar o que viu. Daí o conseguimento onde outros fracassaram. Que idade tem, António Cândido Franco? Em si, a memória é um milagre.

Até mais ver. Seu dedicado   

 

                                               António Telmo

 

 

VOZ PASSIVA. 62

29-08-2015 22:05

De uma (re)leitura de História Secreta de Portugal de António Telmo

Eduardo Aroso

 

Santa Maria, no portal sul do Mosteiro dos Jerónimos – e cuja posição arquitectónica a António Telmo não passou despercebida na sua ímpar obra – lançando o seu olhar sobre o Atlântico, como que acompanhando a frota de Cabral, parece profetizar sobre a grande civilização do futuro a que se chama Brasil. De outro modo podemos vê-la, como indizível presença no altar dos céus que é o Cruzeiro do Sul, constelação que, segundo o emérito astrónomo brasileiro Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, em A Astronomia em Camões a refere como «uma das glórias dos navegantes portugueses, que a teriam registado pela primeira vez». Não é descabido, portanto, vê-la com mais ou menos metáfora no céu nocturno sobre a cruz das quatro estrelas que Camões em Os Lusíadas, VIII, 71, refere do seguinte modo: «Descobrir pôde a parte que faz clara/ De Argos, da Hidra a Luz, da Lebre e da Ara.»

Santa Maria a mesma Senhora resplandecente sobre uma azinheira no centro de Portugal, e que no trânsito mistérico se poderá esclarecer talvez um dia se este local, onde, bem perto, os Templários assentaram praça, tem repercussão com o famigerado centro do mundo conhecido por Agartha e outros nomes. É deveras interessante pensarmos que o culto à Senhora, o mesmo é dizer a um supremo princípio maternal e feminino, foi requerido pelos Templários, guerreiros do lado de fora e secretos do lado de dentro, mas onde se vê claramente que os dois círculos e até o princípio da dualidade (veja-se o cavalo com duas figuras, que alguns identificam como o signo astrológico de Gémeos, o do movimento e das viagens) numa ordem guerreira, portanto dinâmica e marciana, tenha tido no seu seio a vibração da candura feminina da Virgem Maria.

Já que de planetas também se fala, não me consta que se tenha reparado num pormenor notável: é que tanto as aparições de Fátima, de Maio, como as de Outubro se dão nos meses dos signos Touro e Balança, ambos regidos pelo planeta Vénus, da harmonia e da paz, conhecido também como a estrela d’ alva ou estrela da manhã e estrela da tarde.
Assim, no olhar benevolente e cintilante como o mais amplo horizonte ao nascer do sol, a mesma Senhora vigilante no portal sul dos Jerónimos ou da azinheira do centro de Portugal, parece confirmar e aguardar serenamente aquela frase que tantas vezes o mestre António Telmo proferia: «reunir o que está disperso».

29-8-2015, dia de plenilúnio Virgem-Peixe

 

FOTOS COM HISTÓRIA(S). 06

27-08-2015 20:32

Manuel Victorino esteve esta semana em Almeida e fez-nos chegar algumas fotografias da casa onde seu pai nasceu, o que muito lhe agradecemos. A oportunidade permite-nos igualmente revelar alguns dados novos sobre os primeiros anos da vida do autor de História Secreta de Portugal, em particular na sua relação com a terra natal, num trabalho de investigação de Pedro Martins e Risoleta Pinto Pedro, que preparam presentemente uma biografia de António Telmo.     

A CASA ONDE ANTÓNIO TELMO NASCEU

 

Délivrance

Está em festa o lar do nosso querido Director, pelo nascimento dum pequenito.

Tanto o pequerrucho como sua mãe D. Maria Cândida Carvalho dos Santos Victorino, encontram-se bem.

Parabéns.”

 

Na sua edição de 10 de Maio de 1927, o jornal O Almeidense noticiava deste modo o nascimento de António Telmo. O futuro filósofo vira a luz do mundo, pela primeira vez, em 2 desse mês, em Almeida, na Rua do Convento, na casa que as fotografias agora nos mostram.

António Telmo partiu para África, com a família, ao que tudo indica, em 1929. O filósofo afirmava que esteve em Moçâmedes, onde seu pai dirigiu a agência local do Banco Nacional Ultramarino, entre os dois e os seis anos. Há aqui uma ligeira imprecisão, absolutamente compreensível, pois é ainda com a idade de cinco anos que Telmo regressa à Metrópole. Uma outra notícia, de O Almeidense de 18 de Novembro de 1932, revela-se, a este respeito, inequívoca: 

 

“De África, onde passou perto de quatro anos na gerência do Banco de Angola, em Mossâmedes, regressou de licença, o nosso querido amigo e antigo director de «O Almeidense», sr. Dr. António Diniz Victorino, acompanhado de sua esposa e gentis filhos.

Para o antigo director e prezado camarada, acompanhando as nossas saudações de boas vindas, vai um grande abraço de «O Almeidense», sinceríssimo, cheio de calor, para quem com tanto valor, como o Dr. António Victorino, soube dar vida e fé a este periódico, que já hoje completa 7 anos de existência.” 

 

É, pois, também possível que Telmo não tivesse ainda completado dois anos quando partiu para África, atenta a referência do articulista ao período de perto de quatro anos que durou a comissão de serviço de seu pai. Certo é que no ano seguinte voltará à terra natal, segundo se conclui pela leitura de O Almeidense de 12 de Setembro de 1933: 

 

“Para Lisboa, acompanhada de seus filhinhos, seguiu a Sr.ª D. Cândida Victorino.” 

 

E em 1934, ano da morte de seu avô materno, Joaquim Carvalho dos Santos, a cujo funeral assistiu, António Telmo esteve de novo em Almeida

Depois disso, o filósofo não regressou, se não episodicamente, à terra que lhe foi berço. Outros caminhos o chamariam...

INÉDITOS. 55

25-08-2015 12:37

Oferecemos hoje aos leitores "O messianismo", um dos capítulos do livro Álvaro Ribeiro e a Gnose Judaica, que será parte integrante do IV Volume das Obras Completas de António Telmo. O filósofo não o chegou a concluir. Mas o que nele brevemente afirma afigura-se-nos uma preciosa novidade.

O messianismo

 

Vimos que a designação mais corrente de árvore não é absoluta, pois outros termos existem para significar a tábua das categorias: trono, balança, carro, homem, etc….

Trono é o termo preferido por Álvaro Ribeiro que quase sempre o associa a escada e a escala, comparando a visão de Ezequiel com a visão de Jacob.

Nas páginas finais d’A Literatura de José Régio distingue antropomorfismo de antropolatria, valorizando um para repudiar a outra, parecendo aceitar a tese de Protágoras de que o homem é a medida de todas as coisas.

O livro aristotélico Da Alma, com a sua divisão do homem em corpo elemental, alma vegetativa, sensitiva e intelectiva, segue de perto o esquema cabalista: corpo, nephesh (alma vital), ruah (alma–sopro), neshamah (alma intelectiva). É o que, segundo o Zohar, se pode ver na chama de uma vela.

A figuração de Cristo, à luz da Cabala, permitiu aos cristãos-novos praticarem a nova religião sem traírem a religião de nascimento, com um mínimo de hipocrisia e um máximo de diplomacia. A duplicidade não é condenável quando há um terceiro termo a garantir a coexistência aparentemente contraditória. Alguns adágios sefardis referem-se à situação psicológica do cristão-novo: quem não quer ser lobo não lhe veste a pele, o hábito faz o monge. Ao que respondiam os iniciados, justificando a hipocrisia, com a variante “o hábito não faz o monge”.

Onde faltou a filosofia, instalou-se, na sucessão das gerações, o remorso que divide a alma. Com efeito, para os portugueses, o problema de Cristo é o primeiro problema.

Álvaro Ribeiro adopta a solução da terceira tradição – a islâmica – que vê em Cristo um profeta, um novo Moisés que veio depurar a religião de seus pais, e de modo nenhum instituir uma nova religião. Isto equivale a pensar que o catolicismo deve, em princípio, perpetuar o judaísmo. O obstáculo consiste em (…)[1]  


António Telmo



[1] N. do O. – António Telmo interrompe neste ponto a escrita do presente capítulo, sem a retomar.

 

DISPERSOS. 13

24-08-2015 09:27

A conversão[1]

 

A conversão de Leonardo Coimbra ao catolicismo é interpretável e tem sido interpretada pela parábola do Filho Pródigo, mas alcança-se, na altura, todo o sentido da parábola? Deve a conversão ser entendida como o abandono do erro e o retomar do caminho direito? Ou como uma iluminação?

Tudo quanto o filósofo pensou, escreveu e disse, enquanto andou por fora e bem longe, é para desprezar ou só alguma coisa? Que livros devemos ter por legendas, isto é, dignos de serem lidos?

Ou dizemos que apenas a vontade errava, mas no pensamento Leonardo Coimbra foi sempre católico e só no fim se comoveu a vontade? Neste caso, terá para nós um interesse meramente exemplar.

O que é a parábola do Filho Pródigo?

Imaginemos que a Maçonaria foi o Egipto de Leonardo Coimbra. Diremos então que essa tão discutida instituição, tão intimamente ligada às ciências materialistas, mas também às ciências ocultas, com seu sonho republicano de liberdade política e religiosa, foi a terra negra onde se entenebreceu a luz do seu espírito e se degradou a energia do seu pensamento?

A parábola do Filho Pródigo poderá representar, nos termos de Leonardo Coimbra, a entropia, pela qual a energia se degrada e perde até ao aniquilamento da Criação. Mas, no seu pensamento, a vida é já o movimento contrário ao da entropia. Quando o éon perdido dos onze (fuga de José para o Egipto) ou, o duplo extraviado ou extravagante da parábola, ou o Filho de Deus descido e encarnado na terra regressa, não haverá um «aumento de ser» ou tudo fica como dantes na «inutilidade de um mundo feito»?

Nos termos iniciais: A conversão de Leonardo Coimbra não veio trazer nada de novo ao catolicismo?

Esta interpretação pela parábola do Filho Pródigo do regresso de Leonardo Coimbra à religião de infância pode receber a forma desta pergunta: O que andou fazendo entretanto o emigrante e porquê?

Porquê a erradia circulação das energias?

Havemos de continuar a pôr em termos de bem e de mal as oposições que necessariamente se dão com o movimento criacionista da energia espiritual? Nem no mundo da família é um mal a oposição do filho ao pai, do filho que parte e se separa à procura de uma vida diferente, nem no mundo natural as aves emigrantes são menos belas, menos fortes, menos audaciosas do que as aves sedentárias.

Todos sabemos da importância que Leonardo Coimbra dava à «experiência», isto é, ao viver em perigo ou em esperança. Assim, escreveu:

«O desprezo da experiência produz contemporaneamente a morte da ciência e da moral integral ou religião. Quando o homem cristaliza, em dogmas repousados, as grandes experiências cósmicas, resulta uma invasão do pensamento pensado e a estagnação da actividade científica ou religiosa. São os períodos de formalismo excessivo e, consequentemente, de um desatinado egoísmo de seita. A mística, romântica erupção do cósmico através do individual, é um prenúncio de libertadora atenção à realidade, como mostra a história da Idade Média e a sua condenação pelo Dogma».

É ainda preciso perguntar pela razão da sua «extravagância»?

Em escritos e discursos fez a apologia da Maçonaria; militou pela República contra jesuítas e reaccionários; opôs-se ao ensino eclesiástico. Explica-se assim a surpresa de amigos e discípulos, quando tiveram notícia da sua conversão. Todavia, se pensarmos que, na realidade, lutava por uma Igreja renovada ou restituída, muito semelhante à que hoje vemos desenhar-se na mente do actual Papa, teremos maior interesse em saber como sempre foi católico do que em verificar que foi anti-católico.

À luz do «criacionismo», a parábola do Filho Pródigo toma, pois, outro sentido. Não é legítimo ver à mesma luz a tentativa de uma Igreja Lusitana, de Teixeira de Pascoais, a Condição e Destino do Pensamento Português, de José Marinho e o movimento de Filosofia Portuguesa, de Álvaro Ribeiro?

Neste sentido, não houve conversão de Leonardo Coimbra. Ou, por outras palavras, a conversão foi a sua última experiência que antecedeu o seu verdadeiro regresso nove dias depois.

Se a religião é a moral integral, a filosofia é, pelo pensamento em que é e se move, «a única oração eficaz». Na verdade escreveu que «o pensamento filosófico é a única oração eficaz». Esta frase pode, evidentemente, receber a interpretação de que não há oração eficaz fora do pensamento filosófico.

Escreveu também: «O pensamento tem em si a sua própria garantia».

Somente a própria garantia?

Já vimos que não. Vimos que o pensamento não é só para pensar. Quando é bem consciente de si, a sua verdadeira e íntima natureza é o amor. Move porque é o amor. Todos toleram a filosofia quando está ao serviço da Religião ou do Estado. Não admitem que, por si só, possa servir Deus ou a Terra.

É a partir daqui que podemos compreender a hostilidade para com Leonardo Coimbra e para com a filosofia portuguesa, e, em geral, para com todos os filósofos, desde Sócrates a Álvaro Ribeiro. É uma hostilidade que vem da direita e da esquerda e que tem sempre um cómico ao serviço. A filosofia, porque é sincera, humilde, corajosa e verdadeira constitui um alarme para a tranquilidade instável estabelecida sobre um determinado conjunto de interesses. Há nela qualquer coisa como a rebeldia dos Anjos. Mas a rebeldia dos Anjos não é, sob outra forma, a parábola do Filho Pródigo? Porque é que o anjo rebelde não há-de um dia regressar, pelo seu retorno reintegrando todas as parcelas de luz dispersas?

É este um dos sentidos mais fundos da filosofia de Sampaio Bruno. Os comparativistas hão-de reconhecer um dia em Leonardo Coimbra toda a herança de Bruno. O conceito de entropia, que vai buscar aparentemente à ciência, é, no mundo da matéria, a ideia da queda que Bruno situa no mistério insondável de Deus. Há uma perda constante de energia, que a vida biológica ininterruptamente recupera e que a vida espiritual inverte num perpétuo «aumento de ser». Tal é, no «criacionismo», o movimento pelo qual se ligam os três mundos que constituem o universo.

E a missão do homem?

Onde Sampaio Bruno responde que é «ajudar a evolução da natureza», Leonardo Coimbra hesita, contradiz-se, retoma humildade e coragem para perguntar:

«É o homem capaz de criar energias?»

Duas concepções se opõem no espírito do filósofo: uma segundo a qual o mundo criado por Deus é um grande autómato, girando sobre si próprio, por tal forma agenciado nas partes e no todo que sempre em si conservará a mesma quantidade de movimento; outra que imagina o mundo como uma corrente da plenitude do todo para o abismo do Nada. A primeira deriva dos filósofos matemáticos, como Descartes e Leibniz; a segunda inspira-se dos modernos físicos e identifica-se como um dos aspectos da filosofia de Bruno. Se o homem tem por missão colaborar na ordem do mundo enquanto elemento dessa ordem, destruindo a liberdade, «essa missão é bem estúpida e ignara»; Leonardo Coimbra não quer perder tempo com uma doutrina conservadora que é o oposto da ideia criacionista; outro oposto dessa ideia é o facto inegável de «que o homem assiste ao envelhecimento próprio e alheio, quase impotente, e é levado na corrente da degradação física para a morte do planeta e dos mundos».

A missão do homem poderá ser, pois, a de criar energia, a de ser capaz de se assumir como um centro poderoso: «O homem seria Deus porque criava ser, visto que aumentava ou diminuía a realidade».

A que corrente de pensamento alude aqui Leonardo Coimbra? Conjecturamos que ao martinismo que deve ter conhecido através de Sampaio Bruno e que parece tê-lo seduzido de passagem. A conjectura nasce das implicações contidas nas seguintes linhas: «Neste desejo humano (de criar energia), há o orgulho de anjo rebelde, há um movimento para a Unidade de que o homem seria o foco e a razão única».

Aos mesmos responde, reflectindo, com as noções ocultistas de evolução e involução: «De resto, é a evolução integral e perfeita? é desacompanhada duma involução superior que a justifique?

É tão trágica a descida das energias, a corrida para um equilíbrio físico?

Não é antes um sinal bem evidente da divindade, dum poder de criação que renova os mundos, ou, por uma superior ordenação, acode à queda física?»

No último parágrafo está condensado todo o «criacionismo». Mas, então, qual é o papel do homem?

A sombra da primeira concepção, que fora arredada por estúpida e ignara, levanta-se de novo, não obstante a imagem da cadeia tenha, para nossa felicidade e do próprio pensador, sido substituída pela da escada da visão de Jacob por onde os anjos descem e sobem. É, todavia, necessário ressalvar a liberdade do homem.

A nossa missão, diz-nos, é ver, meditar e compreender. É o pensamento. Se, por uma superior analogia, pudermos repetir em nós «o Universo resplendente de acção criadora e presença divina» erguendo-se «sobre o Universo visto em fatalidade» teremos encontrado o único sentido possível da nossa liberdade.

Nas páginas que vimos reflectindo d'A Alegria, a Dor e a Graça (194-197), o problema da liberdade humana procura uma solução também no modo de «experiência» que utilizarmos. Leonardo Coimbra escreve a palavra Experiência em itálico e com inicial maiúscula. A quem se dirige, quando diz compreender «muito bem a necessidade da Experiência? A que modo ou tipo de experiência se refere, quando logo opõe que ela «só é uma longa e meditativa conversa com o Ser»? Porque, dos dois adjectivos, só sublinha o segundo?

Não é certamente à experiência científica. Refere-se, sem dúvida, a um modo de experiência mediante o qual o homem possa criar energias. Não é, certamente, à experiência científica, porque nunca se trata aí de criar energias, mas de conduzi-las. Há um outro passo do mesmo livro onde a mesma pergunta é posta de outro modo, mas com incidência no mesmo problema: «É o homem capaz de criar imagens?» De criar, isto é, de pô-las viventes e bem objectivadas, fora de nós.

Não haverá aqui, de novo, alusão ao «martinismo», operativo no domínio da magia e da teurgia?

Se assim é, compreende-se que Leonardo Coimbra oponha a tal operatividade, que se propõe criar imagens e energias, a sugestão de uma experiência que seja só uma longa e meditativa conversa com o Ser. Todavia, o módulo experiencial, num e noutro caso, deve ser o mesmo.

São as seguintes as palavras terminais de A Razão Experimental:

«De olhos cerrados, em íntima meditação, deixemos a alma apontar seu rumo».

Tal modo de meditação é, em si, a experiência do «grande sentido oculto do Universo», na qual podemos confiar porque «basta uma hora de meditação para conhecermos que somos um espírito».

Para tanto, duas virtudes são, pelo menos indispensáveis: coragem e humildade. Porquê coragem?

Não foi por falta de coragem que pôs de parte magia e teurgia, mas por humildade:

«O que há de propício no estranho é a sua parte de essência, que nós podemos penetrar pelo movimento, ou amor, mas que não poderemos aniquilar ainda que bem diabólico seja o desejo».

Mas a experiência é sempre um risco ainda quando seja «a socialização do nosso ser ou liberdade com os outros seres». Deve-mos acrescentar aqui «visíveis e invisíveis».

Eis, pois, dado um dos aspectos da visão ocultista de Leonardo Coimbra. Quem se aproximar da sua obra sem a noção de analogia poderá, evidentemente, descobrir muito no domínio do seu pensamento exterior, mas o essencial, aquilo que se revela pelo encontro do pensamento com a experiência ficará inteiramente por conhecer.

Leonardo Coimbra, isto é, o movimento da sua filosofia não deve ser apenas interpretado, mas interiormente repetido, por forma a que, enquanto nele meditamos, se transforme numa perfeita ressonância que é, já fora de Leonardo Coimbra, a nossa própria visão.

 

António Telmo



[1]Leonardo Coimbra, Filósofo do Real e do Ideal, Lisboa, 1985, pp. 203-209.
 


EDITORIAL. 04

22-08-2015 20:17

O futuro tem um nome: António Telmo

 

O número de visitas desta página conheceu ontem um novo recorde: 492. Se o facto se explica sobretudo pelas diversas publicações com que nesse dia e na véspera assinalámos a passagem do quinto aniversário da partida do nosso patrono, não deixa porém de ser digna de registo e de sublinhado uma marca absolutamente invulgar neste domínio.

Dentro de três meses, o Projecto António Telmo. Vida e Obra terá completado dois anos de vida. É hoje uma realidade inquestionável, implantada a nível nacional (com particular incidência na Grande Lisboa, no Alentejo, em Coimbra e no Porto), fruto de uma acção séria, persistente, dedicada e – por tudo isto – reconhecida, respeitada. A este propósito, não devemos ainda esquecer a presença do nosso Projecto no Brasil, através da colaboração dos nossos confrades que o representam em metrópoles como Brasília, Rio de Janeiro ou Belo Horizonte.

As Obras Completas de António Telmo, editadas pela Zéfiro, casa que é nosso principal parceiro, e que contam com o apoio institucional e científico do Projecto, veem, neste momento, o seu IV Volume em fase final de elaboração. Até ao final do ano em curso, e em pouco mais de dois anos, estarão repostos no mercado livreiro todos os livros que António Telmo publicou até ao final da década de 1980. Ao mesmo tempo, centenas de páginas inéditas têm sido exumadas do espólio do filósofo, em muito ampliando os horizontes do conhecimento da sua vida, da sua obra, do seu pensamento.

Ainda em parceria com a Zéfiro, foi inaugurada, já este ano, a Colecção Thomé Nathanael – Estudos sobre António Telmo, com a edição do primeiro livro de um só autor sobre o nosso patrono.

As Tardes Télmicas, promovidas em colaboração com a Câmara Municipal de Sesimbra, retomarão no início de Outubro a sua segunda edição, que, à semelhança da anterior, vem conhecendo apreciável sucesso.

Assumindo-se como um projecto irradiante no seio da Filosofia Portuguesa, o Projecto António Telmo. Vida e Obra continua ainda, em parceria com instituições como o jornal Raio de Luz ou a Câmara Municipal de Almada, a promover o estudo e a divulgação da obra de Agostinho da Silva, um dos quatro mestres de António Telmo, através dos ciclos de palestras Agostinho Revisitado: Novas Aproximações, e isto depois do enorme sucesso que conheceram, em 2014, as comemorações agostinianas de matriz télmica do 20.º aniversário da partida do Estranhíssimo Colosso, de que o momento culminante terá sido, em 26 de Novembro último, a sessão de homenagem “Encontro com Agostinho da Silva”, promovida pela Biblioteca Nacional de Portugal em parceria com o nosso parceiro Centro de Estudos Bocageanos, e na qual se apresentaram os dois únicos livros de agostiniana publicados nesse ano comemorativo, ambos com o selo inquestionável do nosso Projecto.

António Quadros será outro dos nomes a celebrar este ano pela família télmica, com a edição, pela Fundação António Quadros e pela Labirinto de Letras, e que conta com o apoio institucional e científico do nosso Projecto, do livro António Quadros e António Telmo: Epistolário e Estudos Complementares.

Ainda em 2015, António Telmo estará em foco em dois congressos internacionais, um a realizar no Porto, em Novembro, comemorativo do centenário da morte de Sampaio Bruno, e o outro em Dezembro, em Lisboa, sobre Judeus e Cristãos-Novos no Mundo Lusófono. Em ambos serão oradores membros do nosso Projecto, que assim neles garantirão a presença télmica.

A acção do Projecto António Telmo. Vida e Obra estende-se ainda à colaboração com revistas que se constituem como nossos parceiros privilegiados, casos da revista de cultura libertária A IDEIA e da DEVIR – Revista de Cultura Ibero-Americana, que ainda este ano darão a lume escritos inéditos de António Telmo e outros da autoria de membros do nosso Projecto, sobre Telmo ou sobre figuras marcantes do seu universo.

Para além de toda esta actividade, mais notória, o Projecto é – hoje e sempre – uma realidade que se cumpre ainda no trabalho de investigação biográfica e bibliográfica e de estudo do pensamento de António Telmo, continuando o seu ponto de partida – a página que o leitor agora está a ler – a ser o ponto de encontro de quantos lhe dão alma, tornando o seu patrono cada vez mais vivo, mais presente, mais movente.

Não cabe nomear aqui qualquer um dos trinta e cinco membros autores que integram presentemente o Projecto António Telmo. Vida e Obra. Há, porém, um nome que não podemos deixar agora de consignar: o de Maria Antónia Victorino, membro honorário do nosso Projecto. Pela confiança, pelo estímulo e pela colaboração com que continuamente nos honra. Para ela, a nossa mais profunda e sentida palavra de gratidão.

O tempo tem mostrado que esta causa vale bem a pena. Que os combates que, por vezes, com desassombro, houve que travar eram necessários e não foram em vão. Que o futuro tem um nome: António Telmo.  

VERDES ANOS. 14

22-08-2015 17:33

«A Razão Animada» de Álvaro Ribeiro[1]

 

Este novo livro de Álvaro Ribeiro vem confirmar a sua tese fundamental de que a filosofia é uma arte. Tese pela primeira vez defendida entre nós, é de tal importância no pensamento deste discípulo de Leonardo Coimbra, Teixeira Rego e Sampaio Bruno, que aparece compreendida no título de um dos seus livros. De facto, se fosse demonstrado que a filosofia não é uma arte da palavra, todas as restantes teses de Álvaro Ribeiro cairiam pela base. A filologia ou estudo da língua pátria deixava então de poder ser o método da filosofia.

Felizmente para a cultura portuguesa, não é possível refutar esta tese nem as suas consequências, sem cair em qualquer forma de positivismo que defina a filosofia como ciência ou como técnica. Ao longo de uma série de opúsculos e de volumes, este autor acumulou uma argumentação poderosa, cujas provas se vão desenvolvendo na razão directa da compreensão das novas gerações. Neste sentido, é curioso observar que a obra de Álvaro Ribeiro, tão bem acolhida pelos escritores da geração de 50, não logra o mesmo entendimento entre os contemporâneos do autor e muito menos entre os ensaístas já consagrados e prestes a entrar na Academia das Ciências. A prova do que afirmamos está em que o autor não oculta a sua amargura por verificar que, após alguns anos de doutrinação, crítica e propaganda, não conseguiu convencer as autoridades responsáveis a substituírem o ensino das filosofias estrangeiras pelo da filosofia portuguesa, nas escolas públicas, nomeadamente nos liceus e nas universidades.

Em Portugal, o valor dos livros e dos escritores estabelece-se em função da opinião pública, que é a opinião dos outros, e não pela leitura e análise directa dos textos. Assim acontece que, a respeito dos livros de Álvaro Ribeiro, já tenhamos ouvido os juízos mais contraditórios. Esperamos que o leitor os julgue por si próprio e não se limite a confiar na nossa recensão, que tem apenas o intuito de dar notícia de uma obra de pensamento notável, pelo menos quanto ao contraste que estabelece com a mediocridade do ambiente.

A Razão Animada, como o título indica, desenvolve-se no contraste com a opinião medíocre de que o homem é um animal racional e deste modo se justifica o subtítulo do livro, que diz ser um «sumário de antropologia». Efectivamente, se o homem é essencialmente razão ou discurso, enfim, silogismo, é natural que nas disciplinas filológicas tenhamos de procurar as características da humanidade. Por isso, o autor nos propõe a reflexão dos problemas de estilística, poética e retórica, à luz do seu critério antropológico, que expressamente filia em Bergson, mas do qual extrai consequências que o filósofo francês não alcançou. Na consecução deste programa, Álvaro Ribeiro detém-se a estudar os três géneros literários em prosa, (conto, romance e novela) dotando-os da respectiva justificação filosófica, o que, segundo cremos, nunca tinha ainda sido tentado na nossa cultura.

Ante esta luminosa fenomenologia da literatura, empalidecem os livros clássicos de historiadores, tais como Hernâni Cidade, Fidelino de Figueiredo e Teófilo Braga, cujas monografias, por muito prestáveis que sejam ao estudioso, carecem do essencial que é a legitimação filosófica, para não falarmos em críticos e historiadores do nosso tempo que muitas lições podem receber na leitura da Razão Animada.

Seguindo o preceito do seu mestre José Teixeira Rego de que «a literatura é expressão do sobrenatural» e não da sociedade, conforme dizem os positivistas franceses, o antigo aluno da Faculdade de Letras do Porto, hoje o filósofo português de maior audiência nas novas gerações, investiga, na estrutura das obras literárias, o conteúdo filosófico de temas tais como o amor, a justiça e a morte. E dessa investigação, quando levada a efeito com a metodologia adequada, hão-de os estudiosos colher as provas da existência da filosofia portuguesa.

Foi este livro já notado também pelo rigor e pela fluidez do estilo que o escreveu. Difícil é caracterizar uma prosa sem par em toda a literatura portuguesa. Todavia diremos que, para Álvaro Ribeiro, que alude à imagem do remo, as palavras ora são o ponto de apoio, ora representam a potência ou a resistência de uma alavanca poderosa da navegação espiritual, que agora começamos a ver ter sido toda a história da cultura portuguesa.

 

António Telmo

 

Liv. Bertrand — Lisboa, 1957.


[1] 57, ano I, n.º 1, Lisboa, Maio de 1957, p. 10.

 

VOZ PASSIVA. 61

21-08-2015 00:33

António Telmo no convívio do Grupo da Filosofia Portuguesa

João Ferreira

[João Ferreira, no Porto, em Dezembro de 2014]

 

António Telmo no convívio do Grupo da Filosofia Portuguesa

João Ferreira

 

[...] "Meu caro João Ferreira, que memórias guarda da tertúlia nos cafés de Lisboa nos anos 50 e 60? Lembra-se de ter visto o Telmo por lá? Como era o relacionamento entre Álvaro e Marinho e destes com os discípulos? Recorda algum episódio em particular? O seu testemunho ser-nos-á precioso!..."

 Carta de Pedro Martins a João Ferreira. Em 16 de julho de 2015.

 

Pedro Martins, coordenador da edição das Obras Completas de António Telmo e autor de Um António Telmo publicado neste ano de 2015 pede-me um depoimento sobre António Telmo na tertúlia filosófica presidida por Álvaro Ribeiro e José Marinho em alguns cafés de Lisboa pelos anos 50 e 60. Naturalmente meu depoimento será muito limitado e apenas a versão daquilo que pude testemunhar. Outras pessoas do tempo poderão completar minha versão.

Para nos situarmos  no tempo lembro que regressei da Itália em dezembro de 1953 e fui residir em Leiria onde estive até junho de 1963. Ia a Lisboa algumas vezes ao ano, e aproveitava para me encontrar com meus amigos do Grupo da Filosofia Portuguesa no café Palladium.

Em 1954 publiquei na revista "Colectanea de Estudos" Temas de cultura filosófica portuguesa. Sobre a posição doutrinal de Pedro Hispano e enviei uma separata do ensaio a Álvaro Ribeiro. O Mestre se entusiasmou com o que leu sobre Pedro Hispano, e publicou no Diário Popular um comentário falando do trabalho, de Pedro Hispano e do aristotelismo em Portugal. Me convidou a visitar o Café Palladium para conhecer o grupo da Filosofia Portuguesa na próxima vez que fosse a Lisboa. Aconteceu que tive de ir a Lisboa nessa altura, e então escrevi ao Álvaro e marcamos o encontro no Palladium. Bem benevolente, Álvaro me  apresentou a José Marinho, a Orlando Vitorino,que eu já conhecia, a Afonso Botelho, a António Quadros, a António Braz Teixeira e aos demais componentes do grupo. Não me lembro se nesse primeiro encontro estava António Telmo, mas é bem provável que sim pois ele sempre acompanhava seu irmão Orlando. Havia outros membros jovens na tertúlia : Fernando Morgado, Luis Zuzarte, Francisco Sottomayor, entre outros. A impressão positiva que recolhi foi que Álvaro Ribeiro e José Marinho repartiam a liderança com a autoridade de mestres e sábios inteligentes.Mantinham-se em seus lugares como pares de todos os outros, deixavam fluir as temáticas e os debates. A presença deles estimulava os jovens. Álvaro Ribeiro ouvia e dialogava. José Marinho tinha como característica acompanhar, com um olhar muito vivo, a intervenção de cada um nas discussões. Por vezes iam também ao café figuras ilustres da amizade do grupo sobretudo leonardistas ou antigos alunos da Faculdade de Letras do Porto. Numa de minhas visitas ao Palladium encontrei José Sant'Ana Dionísio, que havia publicado em 1953, pela Seara Nova, O Poeta essa ave metafísica. Álvaro Ribeiro sugeriu-me que levasse para a tertúlia um comentário sobre o livro. Sant'Ana Dionísio compareceu e houve um interessante debate sobre o livro.

O que deve ser ressaltado é que grande parte dos componentes do grupo participava não apenas dos debates no café, mas de publicações, de conferências e debates que se desenvolviam na área de interesse do grupo. Delas participava António Telmo.

Entre esses eventos históricos que intensamente se produziram estão os Teoremas de Teatro, que acompanhei de 1955 a 1957 no Teatro Trindade e que eram coordenados por Orlando Vitorino e Azinhal Abelho. Antônio Telmo participava do debate que era aberto ao público após a apresentação dos Teoremas de Teatro

A partir de 1957, o Grupo da Filosofia Portuguesa entrou numa nova fase. António Quadros publicou o jornal "57" e com ele nasceu naturalmente um novo movimento cultural dentro do grupo da Filosofia Portuguesa. Foi publicado nesse ano de 1957 na revista Itinerarium(Ano III, n. 3, pp.221-259) Fundamentação geral da Filosofia Portuguesa minha primeira manifestação escrita sobre debate da Filosofia Portuguesa. Nesse tempo quando era ainda muito escassa a bibliografia sobre o assunto, o ensaio serviu como guião de um debate sobre Filosofia Portuguesa no Centro Contemporâneo de Cultura, no Largo do Mitelo, 1, em Lisboa. Telmo tinha então 30 anos. Seu irmão Orlando Vitorino entusiasmado com a grande oportunidade em debater um problema que ainda era conhecido só em ambientes restritos, pegou o número da revista Itinerarium, e colocou-o aberto na mesa da presidência  do Centro, convidando o público a discutir os principais pontos que ali eram desenvolvidos. A sala estava cheia. Havia personalidades ilustres interessadas no debate. Entre elas lembro a figura de Orlando Ribeiro(1911-1997), fundador do Centro de Estudos Geográficos, "o geógrafo português do século XX com mais projeção internacional". António Telmo participou do debate também, juntamente com outras figuras do grupo do café Palladium. Entre eles, Álvaro Ribeiro, José Marinho, Afonso Botelho, António Quadros e outros. Em rigor, este seria o primeiro debate público, fora dos ambientes de café e das páginas do livros de Álvaro Ribeiro, e dos textos dos componentes do grupo da Filosofia Portuguesa.

Outro evento que está documentado e que teve a participação de António Telmo juntamente com os principais membros da Filosofia Portuguesa aconteceu em fevereiro de 1956. Em carta de 29 de janeiro de 1956, Álvaro Ribeiro escreve a João Ferreira em nome do grupo da Filosofia Portuguesa para ir a Lisboa para participar de uma programação preparada pelos amigos do grupo da Filosofia Portuguesa. De acordo com a carta de Álvaro Ribeiro, da  programação fazia parte, em primeiro lugar, um colóquio entre meia dúzia de amigos escolhidos às 18 horas em casa do Dr. Afonso Botelho. Em seguida, haveria um jantar na residência de Afonso Botelho e às 22 horas a conferência A Saudade e seus problemas para os sócios do Centro Nacional de Cultura, com  discussão, no final,  para esclarecimentos.Álvaro Ribeiro acrescentava na carta "Pedimos que nos apareça munido de todos os seus trabalhos inéditos porque queremos fazer uma proposta de edição da conferência e de outros escritos menores". Paralelamente à carta de Álvaro Ribeiro recebi também uma carta de Afonso Botelho, no dia 2 de 1956 me convidando para jantar no dia da palestra ("para a qual já partiram os convites") que haverá no Centro Nacional de Cultura. A conferência A Saudade e seus Problemas foi realizada na Quinta-feira que se seguiu ao dia 4 de fevereiro. Afonso Botelho, Antônio Telmo, seu irmão Orlando Vitorino, Antônio Quadros, Álvaro Ribeiro, José Marinho, António Braz Teixeira,entre outros estiveram no centro de todo o debate que se constituiu em torno da temática apresentada. A presença de João Ferreira no Centro Nacional de Cultura celebrava a reabertura do Centro que havia sido inaugurado em 1952 com uma conferência de Teixeira de Pascoaes.

Há outros eventos a relatar que envolvem integrantes  do Grupo da Filosofia Portuguesa e António Telmo. O mais importante talvez seja um evento quase desconhecido e pouco badalado mas muito real que aconteceu em 1956. João Ferreira era então professor de Filosofia dos estudantes do Curso de Filosofia do Seminário Franciscano de Leiria. Organizou para seus alunos um Curso de História da Filosofia Portuguesa (cf. António de Sousa Araújo. "João Ferreira e o seu Cruso de História da Filosofia Portuguesa". In: Itinerarium, ano XLVI, nº 168, setembro-dezembro, 2000, pp.389-480). A notícia deste curso interessou Álvaro Ribeiro e os amigos de Lisboa. Aos poucos, João Ferreira trabalhou também por estabelecer um vínculo mais profundo de Lisboa com Leiria. Com a anuência e colaboração do padre José Alves Pereira foi possível organizar uma conexão envolvendo palestras e presenças importantes idas de Lisboa. Segundo carta de Afonso Botelho que falou em 27 de abril de 1956 sobre "Situação do conhecimento em Portugal", o conferencista dizia:"Devo levar comigo os amigos daqui e por essa razão teremos que voltar no mesmo dia." Na verdade, Afonso Botelho e seus amigos idos de Lisboa compareceram em peso no salão do convento da Portela em Leiria. Além do doutor Luís Filipe, amigo de José Marinho, e de Afonso Botelho, conferencista, foram de Lisboa: José Marinho, Álvaro Ribeiro, Orlando Vitorino, Antonio Telmo e outros elementos do Grupo da Filosofia Portuguesa, e ainda, como surpresa,  dois ícones da Renascença Portuguesa: Augusto Casimiro e Mário Beirão, autor de "O último Lusíada", parceiro de Pascoaes em A Águia e na Renascença Portuguesa. Tudo isso nos dava a sensação de que estávamos numa  segunda versão simbólica da Renascença Portuguesa, desta vez, porém, convergindo das Letras para a Filosofia. Na Carta de 20 de maio de 1956, depois da palestra em Leiria, Afonso Botelho agradece a recepção em Leiria:"Foi-me gratíssimo encontrar na simpatia humana com que nos receberam a marca dessa fundamentada esperança". "Os nossos comuns amigos cá vão, acabando os seus livros e eu a animá-los a meterem-se em novas empresas para as quais conto com o concurso do convento da Portela." Afonso Botelho confidencia a João Ferreira: " Que diz a uma História da Filosofia Portuguesa colaborada por todos ou pelo menos uma História da Filosofia Contemporânea?". Mais tarde Orlando Vitorino falará também, por sua vez, a João Ferreira sobre uma História da Filosofia Portuguesa e convida-o a escrever a parte medieval até ao século XVI. Afonso Botelho, em carta de 25 de agosto de 1956 fala de um Livro sobre Pensamento português e fala de um capítulo reservado para João Ferreira: "O pensamento português no ambiente da Escolástica. Pedro Hispano e sua influência"[...]. E fechava a carta, dizendo: "Todos os Amigos que estão em Lisboa lhe enviam cumprimentos".

Lembrando o encontro em Leiria, José Marinho comentava em 1963, numa carta a João Ferreira: "Desde que o simpático dr. Luís Filipe me levou à Portela ando com desejo de lá voltar. Vamos a ver quando poderá efetivar-se. Se vier a Lisboa peço-lhe que não se esqueça de me dar sinal".

Estes excertos de arquivo e vestígios de memória mostram alguns dados importantes relativos a atividades do Grupo de Filosofia Portuguesa em seus primeiros tempos de constituição e da ligação de António Telmo com o Grupo.

 

31 de julho de 2015

<< 33 | 34 | 35 | 36 | 37 >>