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VOZ PASSIVA. 136
04-10-2023 09:53A anteceder a sessão “António Telmo em Évora”, que se realiza no próximo sábado, dia 7, a partir das 15:30, no Auditório do Convento dos Remédios, em Évora, publicamos hoje o testemunho que, sob a forma de uma carta ao filósofo da razão poética, Armando Carmelo nos deixou de António Telmo.
Telmo e Carmelo conheceram-se em 1965, em Estremoz, numa tertúlia sediada no célebre Café Águias d’Ouro; mas foi no Redondo, a partir de 1971, que ambos estreitaram decisivamente os laços da sua amizade, empreendendo a criação da Escola Preparatória do Redondo, “a primeira escola democrática de Portugal, antes do 25 de abril”, no dizer de Telmo, que foi o seu primeiro director.
O texto, inédito, que hoje se publica foi lido pelo seu autor em 15 de Novembro de 2014, durante a sessão de apresentação de Cartas de Agostinho da Silva para António Telmo na Biblioteca Municipal de Redondo, sediada no belo edifício da primeva Escola Preparatória desta vila alentejana. Agradecemos a Elísio Gala, membro do nosso Projecto, a obtenção, junto da família de Armando Carmelo, do respectivo manuscrito e da autorização para a sua publicação e o auxílio que nos prestou na fixação do texto.
Armando Carmelo, sentado, durante a apresentação de Cartas de Agostinho da Silva para António Telmo, em 15 de Novembro de 2014, na Biblioteca Muncipal do Redondo
Carta para António Telmo
Armando Carmelo
Meu caro António Telmo
Imagina lá para o que hoje me havia de dar… Escrever-te uma carta como sempre desejei fazer a dar-te conta dos meus pensamentos e a lembrar-te da nossa aventura conjunta de fazer uma escola na Vila de Redondo.
Conhecemo-nos nos inícios dos anos 60 do século passado. Sítio? Uma mesa no Café Águias de Ouro sede de uma alegre tertúlia que se dedicava à leitura, à conversa, à troca de ideias e a estranhas incursões no campo das artes divinatórias.
Do grupo, faziam parte, além de nós dois o Malaquias Pimenta, ao sábado, quando se deslocava a Estremoz para dar consultas de odontologia, o escultor Rocha Correia que te acompanhava nas tuas aventuras cinegéticas, o advogado Rodrigues Pereira, especialista em grafologia e em hipnotismo (tinha mesmo um hipnotizado de serviço que nas horas vagas se entretinha a arranjar aparelhos de rádio), o Rui Pacheco que nos intervalos da venda de carros se dedicava à fotografia, o Aníbal Alves meu especial companheiro e amigo, homem de sete ofícios e livreiro encartado.
Tu dedicavas-te mais ao domínio das palavras, escrevias livros de leitura atraente e encantatória. E pensavas em silêncio. Por vezes com tanta intensidade que não precisavas de falar para dares a conhecer os teus pensamentos.
Por essa altura, a actividade do meu grupo restrito de amigos dedicava-se de corpo e alma ao estudo e divulgação da nossa actividade cineclubista. O grande impulsionador dessa actividade frenética fora o Tiago Janeiro Acabado, professor da Escola Secundária que nos tinha levado à criação do Cineclube de Estremoz que não limitava a sua actividade a meras sessões de cinema para sócios mas antes a alargava a exposições, conferências, encontros, edição de escritos e participação activa na imprensa local – Brados do Alentejo, Jornal de Estremoz e Eco de Estremoz.
Não me lembro de ter encontrado em ti grande entusiasmo pela arte cinematográfica e poucas vezes incluí o meu entusiasmo pelo cinema nas nossas conversas.
Falámos, isso sim, muitas vezes e com muito interesse teu no estudo da ASTROLOGIA.
Chegaste mesmo a fazer-me a minha carta do Céu com base na qual o José Luís Conceição Silva, grande entendido em astrologia e a meu pedido, me predisse que eu faria muitas pequenas viagens e nenhuma viagem de vulto. E como sabes assim aconteceu, pois passei trinta anos da minha vida a trabalhar numa biblioteca itinerante da Fundação Calouste Gulbenkian e todos os dias eu fazia uma pequeníssima viagem.
Um dia, em 1966 partiste rumo a Brasília. Por convite de Eudoro de Sousa e Agostinho da Silva foste passar cerca de três anos como docente do Centro de Estudos Portugueses da Universidade de Brasília, donde regressaste em 1969.
No dia 28 de Fevereiro desse mesmo ano houve um sismo intenso que nos encheu de pavor, a mim em Estremoz onde continuei a viver e a ti em Lisboa para onde já tinha regressado.
Voltaste a Estremoz e procuraste encontrar-me para me falar desse susto que também a mim me tinha perturbado. Fomos a Cáceres em passeio. Eu, o Aníbal e tu.
Conversámos sobre a vida e sobre o muito que se passara durante esse interregno e recordo-me de te ter falado do cansaço que me avassalava numa actividade que embora com um importante papel no panorama cultural do País se ia tornando pouco a pouco demasiado cinzenta.
E foi então que, como por artes mágicas, me propuseste colaborar contigo nessa empresa aliciante de fundar uma nova escola na Vila de Redondo.
Com que alegria eu aceitei o convite!
A empresa envolvia alguns riscos. Mas amparámo-nos mutuamente na sua resolução.
Os poderes instituídos locais torciam-nos o nariz. Dois desconhecidos “barbudos” encarregados de abrir uma escola oficial? Que estranhas modernices iriam implantar e que velhos interesses não iriam confrontar?
A escolha do edifício obrigou-nos a vários passos e muitas preocupações.
Com algumas ajudas já nos veio parar às mãos este velho palacete pombalino situado na antiga Rua de Évora com traça do arquitecto-brigadeiro Manuel da Maia, engenheiro do Reino em 1754 e co-autor de entre outras grandes obras – as do Aqueduto das Águas Livres e as da cidade de Lisboa destruída pelo terramoto de 1755. Casa senhorial que ultimamente servira de habitação ao antigo Director da Torre do Tombo, o redondense Dr. João Martins da Silva Marques.
Nada mau. Porem, como transformar tulhas para armazenamento de cereais e adegas térreas carregadas de antigas talhas para armazenamento de vinho em salas de aula?
As obras que logo começaram e se prolongaram pelo largo período estival proporcionaram soluções de consenso entre as várias partes – tu como futuro director da Escola, os mestres de obras e os elementos da comissão de pais de alunos que entretanto tinha sido criada. Uma azáfama de todo o tamanho.
Pouco a pouco tinha sido formado o quadro do pessoal docente da futura escola. Recordo os seus nomes: D. Maria Ângela Quintas, Maria Angélica Palmeiro, D. Maria dos Anjos, D. Maria Emília Caeiro, Padre Póvoa (ou o petranca[1]) Padre João de Deus, D. Maria Luísa Silva, D. Celeste Marouvas, D. Ana Barradas, D. Preciosa, D. Olga e Maria José Cardoso e como professor de História o Dr. Teófilo Costa, o prof. Fonseca e o prof. Soares.
E já agora para que fique exarado em carta e não em acta o pessoal da Secretaria – Maria Antónia Figueira e Adelina, as cozinheiras D. Ana Rosa e a Leocádia e as ajudantes de outros serviços: a Balbina, a Manuela e a Mariana Rita.
E os nossos alunos de que quero lembrar alguns nomes: - O Marovas, o Chico dos Foros, o Dominique, o Domingos Sarnadinha, a Joana Mataloto, a Maria do Céu Gamé, a Júlia Basílio, a Zeza Portel e tantos outros de que não me é possível lembrar os nomes.
Lembras-te dos trabalhos em que nos vimos metidos a comprar o fogão industrial para a cozinha da cantina, os partos e os talheres. E dos trabalhos em que nos vimos metidos quando fizemos sentar na mesma sala para refeições conjuntas alunos e professores?
E as marcas secretas de que só nós sabíamos o significado e a existência. A estrela de David inscrita no chão do piso térreo e a árvore sefirótica com a indicação das várias disciplinas e a grande roda de carro de parelha suspensa da parede da escada de acesso à área nobre do edifício qual carta do céu gigantesca que marcava os destinos da Escola.
O REDONDO É UMA RODA
A ESCOLA UM MOVIMENTO
A nossa escola, a escola do Redondo foi um mundo renovado que conseguimos abrir no seio de uma sociedade medieval de senhores e servos onde ainda imperava o castigo corporal como método de repressão às liberdades.
De vez em quando Sesimbra chamava por ti. E o apelo era quase sempre irresistível. E lá íamos. De uma vez levaste-me ao Castelo. Aí me deste a conhecer um dos teus grandes amigos – o castelão Rafael Monteiro.
Na volta e depois de refastelados com um belo bife de espadarte (no restaurante de um amigo que, de quando em vez, aparecia no Redondo onde vinha comprar vinho que consumia no seu estabelecimento), na volta, dizia, passávamos grande parte do caminho a cantar as velhas modas que ambos conhecíamos.
Quero ainda recordar-te dos passeios que dávamos aos domingos na Serra d’Ossa onde íamos de quando em vez dar liberdade aos teus cães de caça e apanhar espargos que depois cozinhávamos com ovos na cantina da escola.
Hoje, 15 de Novembro de 2014, estou no velho edifício da escola que ajudámos a pôr de pé, agora transformada em Biblioteca Municipal, a evocar a nossa amizade numa sessão dedicada ao estudo das cartas que Agostinho da Silva te enviou.
Ele também visitou a nossa escola. E soube por ti que também ele elogiou o trabalho que aqui desenvolveste.
Tenho saudades do nosso velho convívio e do tempo que aqui passámos juntos.
Ao longo dos anos muitos dos nossos antigos alunos me têm falado da escola que frequentaram e do respeito e amizade que nutrem por ti. Julgo que te vai saber bem, leres isto.
Teu velho amigo de sempre
Armando Carmelo
CORRESPONDÊNCIA. 64
30-09-2023 13:09Carta de Max Hölzer para António Telmo, de 5 de Agosto de 1977
5-8-77
Mon cher Ami,
Votre lettre était – est un beau témoignage – et aussi de vous-même. Elle provoquait[i] en moi tout un faisceau de sentiments. Ma joie n’est pas seulement « personelle », si je puis dire.
Je pense que vous avez reçu, entretemps, la lettre que j’envoyais[ii]à Borba.
Vous verrez de plus en plus que les «distances» entre ce qu’on croit saisir et la compréhension « vécue » sont beaucoup plus grandes (est[sic] c’est peu dire) que tout écrit « ésotérique », ou symbolique nous suggère. La plupart perdraient toute raison d’être écrits si on pouvait ou voudrait voir cette incompatibilité. – Un livre comme celui de G.[iii] est tout[sic] autre chose. La « troisième lecture » nous accompagnera jusqu’à la fin, nous aidera toujours avec sa haute « force » dans les multiples stades – « difficiles » parfois jusqu’à la tentation de l’abandon – qui nous attendent…
Croyez-moi, cher António Telmo, que j’ai (et j’avais toujours) grande confiance en vous – tout en savant, en voyant les quasi – impossibilités que vous rencontrez à votre « manière », comme nous tous à la nôtre. Mais vous avez des « fortes possibilités » et tout ce qu’elles comportent pour vous, qui joueront, pouvions dire, un jour tout autrement…
J’écris un peu entre deux endroits, extérieurement, parce que je déménage le 9 (en bas une nouvelle adresse).
Aussitôt que je peux me le procurer, j’enverrai le vivre (qui a l’apparence de simples récits).
Ne voulez pas aller trop vite – faites des pauses suffisantes entre les lectures. Réservez-vous des moments calmes et éveillés, sans vouloir rien. Mais vous connaissez ces conseils de l’Alchimie.
Je vous embrasse. Mes pensées vous accompagnent. –
4, rue Vigée–Lebrun, F75015 Paris[iv]
Max
[i] Uso do pretérito imperfeito em vez do perfeito ou do passado simples; ex: «elle provoquait en moi» carta de 5-8-77, 3ª linha
[ii] O mesmo caso do uso do imperfeito
[iii] Muito provavelmente Gurdjieff, que constitui, com Ouspensky, referência importante no domínio do conhecimento espiritual.
[iv] Escrito na margem perpendicular esquerda da página.
VOZ PASSIVA. 135
30-09-2023 12:09
António Telmo, memórias do tempo da Revolução
Manuel Calado
Tive a sorte de conhecer o António Telmo, nos finais de 1973, no Redondo, quando já se sentiam os ventos da mudança que, como uma bênção, aos meus olhos juvenis, chegaria, meses depois. No Redondo, onde ambos fomos parar, inaugurando a Escola Pública, na vila, na onda da reforma Veiga Simão. Ele, como director da Escola Preparatória, eu, como professor na Secundária, que tinha como Director outro personagem notável, o Manuel Patrício. Eu, ainda quase imberbe, saído pouco tempo antes das fraldas da serra d'Ossa; o Patrício, vindo do Liceu de Évora, onde tinha ganho notável estatura como professor de Filosofia. O Telmo, vindo uns anos antes, de Brasília, onde foi assistente de Agostinho da Silva. Nos três anos em que fui professor no Redondo, onde criei, aliás, raízes fundas, aprendi muito com vários outros personagens interessantes: lembro, sobretudo o Armando Carmelo e o Vicente Roma, ambos colegas na Secundária. Fora da escola, o clã Salomé Vieira estava, nessa época, muito ativo, no Redondo. O Vitorino, já artista bem conhecido, ia e vinha, mas todos os outros ainda por lá andavam. Desse caldo, me alimentei com gosto e proveito, mas o prato forte foi, sem dúvida, o António Telmo.
Antes do 25 de Abril, retenho dois episódios, algo humorísticos, de que o António Telmo foi protagonista e que me deixaram muito impressionado. Era habitual, nesse tempo, os professores almoçarem nas cantinas, no mesmo espaço que os alunos. O vinho à refeição não era permitido. O António Telmo, como diretor da Escola Preparatória, decidiu substituir os jarros e os copos da cantina, que eram de vidro, por outros, de loiça do Redondo. O objetivo oculto, obviamente, era os professores poderem beber vinho, sem os alunos se aperceberem. Escusado será dizer que eu passei a almoçar na Escola Preparatória, apesar de dar aulas na Secundária.
O outro episódio que me marcou e que, aliás, impressionou profundamente a vila do Redondo, foi protagonizado por um transeunte que teve o azar de ir a passar na rua, quando um miúdo, por brincadeira, cuspiu de uma janela de sacada do primeiro andar e lhe acertou em cheio. O bom do homem foi imediatamente queixar-se ao Senhor Director que, contra todas as expectativas, lhe deu um raspanete, perguntando-lhe se nunca tinha sido criança...
Quando veio Abril e o golpe dos militares, lembro-me da alegria genuína que o António Telmo manifestou, em sintonia com a maioria do pessoal. Criámos, logo a seguir, um grupo de “intervenção cultural” que fez várias tournées na região. Juntávamos música popular (com o Vitorino e o Janita à cabeça), artes plásticas (eu convidei o António Couvinha e o António Cabeça), com alguma intervenção política revolucionária (a Luar estava, nessa época, bem implantada no Redondo). Um desses espectáculos foi organizado pelo António Telmo, em Sesimbra, numa Sociedade Recreativa local. Nessa noite, o Cante alentejano ressoou pelas ruas da vila. Apesar do entusiasmo inicial, o António Telmo rapidamente se desinteressou da política em curso...
Agradeço-lhe ter recebido dele o primeiro aviso contra o arrebanhamento em que, de formas muitas vezes primárias, as forças políticas estavam empenhadas. Manifs e slogans deixaram de fazer parte da minha postura. De resto, se tivesse de definir as posições políticas do António Telmo, eu diria que ele foi, sem o assumir, um libertário.
Mais tarde, já em Estremoz, o Mestre frequentava os dois cafés principais da cidade, nesse tempo: o Águias de Ouro e o Alentejano, cujos clientes se arrumavam, quase sem excepções, à direita, no caso do primeiro, e à esquerda, no segundo. O Telmo frequentava os dois e gostava de armar em comunista, nas conversas com os fascistas e vice-versa. Para o António Telmo, a meu ver, a política era um parente pobre da metafísica. Mais do que intervir no mundo, ele queria pensá-lo e, talvez, entendê-lo. Durante cerca de uma dúzia de anos, frequentei, intermitentemente, as tertúlias que ele promovia, no Alentejo, em Sesimbra ou em Lisboa. Nelas e nas conversas de café, aprendi muito do que gosto de pensar que sei. Sobre isso, que foi o mais importante, tentarei escrever ainda um testemunho.
CORRESPONDÊNCIA. 63
10-09-2023 10:55Carta de Max Hölzer para António Telmo, de 27 de Julho de 1977
27 juillet 77
Mon cher Ami –
plongé dans « toutes sortes » de travaux après mon retour, vous l’imaginez, j’essayais en regardant le « dépôt » qu’ont accumulé en moi les perceptions plus ou moins conscientes pendant mon séjour chez vous, de sentir comment, et avec quoi, continuer. Vous savez que notre moi est – pourrait – être de nature à avoir des conséquences vraiment fructueuses pour ceux qui trouvent en soi les raisons suffisantes –pour continuer – ce qui ne devient pas (avec le temps) plus facil [sic] mais plus difficil [sic], plus exigeant – tout en ouvrant des perspectives sous des domaines autres et, cela ou être reconnu petit à petit dans quelle mesure, jamais touchés par les travaux, occupations, expériences antérieurs, parce qu’on les faisait d’une autre manière. Aussi petit à petit, d’abord, et puis peut-être par des éclairs le montrant plus nettement, un changement dans l’appréciation des choses, de leur importance et signification, va s’opérer – un changement contre lequel, tout, « naturellement », notre « moi » (mais pas tout le passé) se défend obstinément…
Cette lutte serait sans espoir, s’il n’y avait pas d’autre chose en nous qui peut s’éveiller et qui nous procure un goût beaucoup plus intense et complexe, d’exister et d’être. Cette première ligne de travail, ce tout petit commencement nous lie déjà à on nous met en contact sans nous pouvons le connaître [sic][i], avec un monde de consciences « cachées ». Vous le savez. D’autre part, il ne peut pas s’agir d’un effort de se faire connaître par ce monde caché « – tout dépend de notre ? « attraction » intérieure (en nous) par le « divin » pour le « divin ». Il en résulte qu’il n’y a pas de compétition – tout s’ordonne par cette « réalisation » intérieure. Et les différences créent les conditions favorables , parce que difficiles à réconcilier ; surtout aussi par ceux qui nous sont proches d’une manière ou d’autre et qui ne suivent pas le même chemin, qui ne pensent en[ii] rien comprendre ce que nous cherchons.
Trouvez un jour la possibilité de parler bref et clair et plus « principiel » et de répondre aux questions des autres en leur donnant, ouvrant autres questions qui, s’ils y réfléchissent les inquiètent, les dévient, sinon les sortissant de leur manière de penser et par cela peuvent éveiller en eux une parcelle vierge.
Nous ne pouvons pas répondre à une création sans cesse nouvelle, vierge à chaque « haleine ». Alors, qu’est-ce que peut signifier « recommencement » de notre part ? Nous sommes des « limaces » … Mais je sens bien que « quelque chose » (pas « nous » peut-être) a changé déjà.
J’ai écrit une lettre ce jour à notre ami Francisco, dont je veux photocopier une partie qui concerne tous les amis. Et je vous prie que vous aussi communiquez la partie qui concerne la réunion prévue pour « tous » les autres qui participeront.
Tous mes vœux. Je vous embrasse –
Max H.
[i] Apesar de dominar com fluência o francês escrito, é visível, aqui ou ali, como é o caso, sobretudo a nível da construção sintáctica e das concordâncias, que se trata de alguém de outra nacionalidade. O que é curioso é que em alguns dos casos poderíamos estar perante erros cometidos por um falante do português, o que não é verdade.
[ii] A expressão aqui usada «ne pensent en» é um exemplo claro do que afirmamos na nota anterior sobre os erros que poderiam ser cometidos por um falante do português, pois o «penser à» é para nós o «pensar em» que encontramos nesta sequência.
VOZ PASSIVA. 134
29-08-2023 09:30António Telmo e a História Secreta do Figurado de Estremoz
Mara Rosa
Imagem: Amor é cego, de Afonso Ginja. Colecção particular. Foto tirada daqui.
Gramática Secreta da Língua Portuguesa foi o primeiro livro de António Telmo de que tive notícia, cujo título bastaria para percebermos, na sua escrita, a qualidade de unir numa simbiose perfeita os predicados Razão e Mistério.
De então para cá, uma década de permeio paulatinamente desvela aos meus olhos um ser raro, dotado de uma prodigiosa arte poética que alia a uma imaginação criativa. A sua narrativa é simultaneamente clara e profunda, transversalmente plural e universal.
Assim como as tradicionais narrativas míticas, os contos de A. Telmo de certa forma reproduzem o nascimento do cosmos, na medida em que transformam “o tempo, o espaço e o mundo”. Ainda a par com o mito, as suas histórias, plenas de signos muitas vezes associados a realidades arquetípicas, têm sempre um fundamento moral, no sentido heterodoxo da palavra, que induz à reflexão.
Por fim, Telmo cristaliza na sua escrita as paisagens afins, físicas e mentais. Penso em Almeida, a fortificada paisagem raiana aberta a planaltos a perder de vista, berço que o recebeu à nascença, ou Sesimbra que lhe semeou na alma o génio de uma filosofia atlântica... Mas penso sobretudo em Estremoz, terra em que o visionário assentou arraiais, terra da Rainha do culto do Espírito Santo, edificada com o gélido mármore arrancado ao solo, terra de pequenas nascentes e de barrocais, cavados à enxada pelas “bonequeiras”, mulheres sem profissão reconhecida que deram à luz os Bonecos de Estremoz.
E aqui me detenho. Não nas figuras religiosas que no séc. XVI, pelas mãos de plebeias mulheres de parcos recursos, inauguraram a condecorada tradição artesanal estremocense. Detenho-me nas figuras profanas (ou carnavalescas) dos Bonecos de Estremoz, surgidas já no séc. XVIII: O Amor é Cego, o púcaro ornamentado e A Primavera (para a temática do figurado de Estremoz, ver estudos de Azinhal Abelho, Joaquim Vermelho, Hernâni Matos, Hugo Guerreiro).
Detém-me esta tríade plena de carga simbólica, como me deteve quando, em 2019, folheei o livro História Secreta de Portugal (A. Telmo, ed. Zéfiro, 2013). Neste livro, onde o seu autor alude ao hermetismo simbólico do Mosteiro dos Jerónimos e à sua relação iniciática com a figura de Nicolau Coelho, encontrei múltiplas relações com estas três imagens do figurado português, onde facilmente caberia incluir, num trabalho com outra amplitude que não esta pequena evocação, os elementos simbólicos da figura cerâmica da Rainha Isabel de Aragão.
Nas páginas desta História Secreta de Portugal encontramos os nós manuelinos modelados nas botas de O Amor é Cego, o coração ferido por 3 lanças ( p. 53 do livro) e a cornucópia de flores, ambos os elementos seguros nos braços do Amor, junto ao peito; nas páginas deste livro vislumbramos ainda a mais badalada das figuras da barrística de Estremoz, sempre representada de venda nos olhos, na seguinte passagem: “o busto de um homem, visto de frente, com os olhos atados por fios (...)” (p. 66).
Nesta obra, que tanta informação condensa em escassas páginas, também os escudos dos Jerónimos esculpidos em pedra, contendo as cinco chagas de Cristo (p. 53), remetem ao figurado, nomeadamente à Primavera, com a sua semicircunferência em arame, contendo comumente sete ou nove escudos feitos em barro, embora os mais recentes aparentem representar uma flor, são circulares, e têm 5 pontos no interior que podem ser pétalas ou chagas.
Por fim, no púcaro ornamentado com flores e uma espécie de avental, temos o ônfalo do mundo, referido pelo autor em passagem sobre a iniciação, mas nele também temos, simbolicamente, uma fonte (p. 66).
Fica assim evidente, a partir das pistas já abordadas que António Telmo deixou na sua História Secreta de Portugal, uma forte ligação entre os elementos do figurado de Estremoz acima expostos e os vários estágios da iniciação de um cripto-judeu — apresentados na obra consultada.
25 de Agosto de 2023
EDITORIAL. 30
21-08-2023 00:02Évora, o destino e o sentido
Passam hoje treze anos sobre a morte de António Telmo.
Foi em Évora que o filósofo partiu para a grande viagem.
Em 1 de Maio de 1964, em entrevista a’O Benfica Ilustrado, após frisar que a sua simpatia futebolística pelo Lusitano de Évora vinha logo após o benfiquismo que então era o seu, afirmou encontrar-se ligado a Évora pelo destino: – ali fora soldado, ali casara, ali era professor. Não poderia, porém, supor que o fado o vinculava de modo tão radicalmente existencial à capital alentejana.
Facto é que ao longo das décadas, beneficiando da proximidade a que as suas sucessivas moradas de Redondo, Borba ou Estremoz o deixavam da cidade, sempre Telmo regressou a Évora, ali cultivando muitas e boas amizades.
O Projecto António Telmo. Vida e Obra comemora dez anos de existência no próximo dia 20 de Novembro. Uma década de dedicação ao legado do filósofo da razão poética que pretendemos assinalar com um conjunto de iniciativas. A primeira será justamente em Évora, em 7 de Outubro. “António Telmo em Évora” se denomina a sessão que, para além de mais uma apresentação, a cargo de António Cândido Franco, de A Glória da Invenção – Uma aproximação ao pensamento iniciático de António Telmo, de Pedro Martins e Risoleta C. Pinto Pedro – livro editado pela Zéfiro e já nas livrarias em todo o país –, se realizará uma mesa-redonda com amigos eborenses de Telmo, moderada por Rui Arimateia e para a qual estão já confirmadas as participações de António Cândido Franco, Francisco Soares, Maria Sarmento e Manuel Calado. A iniciativa, que terá lugar no Convento dos Remédios – uma palavra de especial agradecimento sendo devida a Rui Arimateia –, nasce de uma parceria entre a Câmara Municipal de Évora e o nosso Projecto e constituirá, por certo, uma bela e justa homenagem a Telmo da parte de quantos com ele conviveram na bela cidade transtagana.
Foi Évora destino e continua a sê-lo. Mas hoje é também sentido.
VOZ PASSIVA. 133
21-08-2023 00:01
Para António Telmo
Risoleta C. Pinto Pedro
Da história à tradição a voz ecoa
No distante intervalo em que soa
O Anjo do Bem: no direito lado
A letra começa, tem seu cabo e fado.
Transmite-lhe o pai precioso dom
Preceito que o guerreiro do pensar
Ignorar não pode, nem mudar o tom:
“Nunca ideia oposta deves degradar”.
Doutrina tão nobre aprende o delfim:
despoja o vazio e o verbo oficial.
Ignora, sabendo, espírito do mal.
A única coisa que importa, por fim
É deixar à porta ouro e enxoval,
Vestir-se de pobre e buscar o Graal.
Almoinha, 21 de Agosto de 2023
VOZ PASSIVA. 132
21-08-2023 00:00Quem pode dizer que conheceu, verdadeiramente, António Telmo?
Maria Sarmento
Conheci o António Telmo pelo que se mostrava de enigma e, simultaneamente, de natural humanidade. Quem pode dizer que conheceu, verdadeiramente, António Telmo? Encontrámo-nos e convivemos várias vezes em circunstâncias ligadas ao pensamento e ao debate de ideias, na companhia de amigos comuns, em tertúlias e encontros de amigos de Évora, de Vila Viçosa e de Estremoz; em visitas a nossa casa, em Évora, para falar com o António sobre as suas pinturas e a leitura simbólica que António Telmo fazia de alguns dos trabalhos do António (Couvinha). Estivemos juntos em conferências e lançamentos de livros, em eventos académicos, maioritariamente ligados à Poesia e à Filosofia dos autores da sua e da nossa preferência, de que cito e destaco: Teixeira de Pascoaes, Álvaro Ribeiro e Agostinho da Silva.
Sempre que amigos comuns se encontravam em Évora, uns porque aqui viviam, outros que aqui se deslocavam para um ou outro evento, nomeio aqui o nosso querido António Cândido Franco, o amigo e na época meu Professor, Francisco Soares, o saudoso José Manuel Capêlo, o Manuel Calado, o António Couvinha, a Paula Costa e o Carlos Dutra, entre outros. Sempre que havia esses encontros, dizia, a presença de António Telmo era uma agradável constante. Muitas vezes, sem querer, porque era mesmo assim a sua força catalisadora, a nossa admiração e afecto centrava-se na sua misteriosa pessoa com uma curiosidade muito atenta.
Posso dizer que “conheci” António Telmo mais pelos seus silêncios do que pelas suas falas. Fazia-se muitas vezes acompanhar de homens que lhe eram dedicados e por ele nutriam admiração profunda. Homem de silêncios prolongados pelo sorriso desafiador, por vezes provocador de controvérsias, com que parecia deleitar-se. Esse silêncio era um questionamento mudo. Tornava-se, em cada um de nós, voz interior e, tantas vezes, um misto de profunda admiração e perturbação, em alguns casos. Eu, nem tanto assim, que à época tinha (e ainda guardo) aquela postura de menina caeiriana a quem era “permitido” pregar partidas e desafiar os sábios. Estar com o António Telmo era nunca esperar pelo que podia acontecer depois desse silêncio e dessas escassas palavras, quase sempre interrogativas ou espaçadamente sentenciosas. O Silêncio que se seguia à interrogação, era diálogo interior, vontade de acertar e, confesso por mim e arrisco pelos outros, desejo de sermos acolhidos pelo seu espírito.
Foram vários os episódios que se passaram directamente comigo e de que guardo grato e misterioso eco e lembrança. Vou relatar apenas dois deles, para não tornar o texto muito extenso. Estávamos numa situação de escolha de uma fotografia minha para a capa do meu livro “O Silêncio e as Vozes”. Sentados à mesa de um café com esplanada, em Évora, estava o José Manuel Capêlo, editor da Árion que iria editar o meu livro, o António Telmo o António Couvinha e eu, Maria Sarmento. Eu tinha pedido ao amigo, galardoado com o ‘Prémio Pessoa’, o fotógrafo José Manuel Rodrigues, que me tirasse uma foto para a badana do livro. Fizemos, na casa dele, uma sessão que, na verdade, resultou numa série de retratos muito sóbrios, a lembrar Florbela Espanca dos quais trouxe os negativos para a escolha da foto que melhor se adequava ao efeito. Mostrei ao editor os negativos e este mostrou-os ao António Telmo. Qual não é o nosso espanto quando este sentenciou, muito sério: “Esta não és tu.” Silêncio. Tudo bem. Tinha razão! Todos concordámos. Mas como dizer ao fotógrafo que não escolhemos nenhum dos negativos e que seria necessário fazer outra sessão? Salvou-nos um pouco do embaraço a amizade de longa data entre nós e o fotógrafo e lá tirámos outras fotos, completamente distintas, num cenário mais natural e descontraído e com uma expressão minha, outra. Pois mandou o destino ou alguém por ele que nos encontrássemos na mesma mesa do café umas semanas depois com outros negativos. O mesmo procedimento. Quando António Telmo os viu. Acenou e sorriu. Soubemos, então, que aquela era eu. Dei-lhe toda a razão e lá escolhemos um dos negativos, o que saiu na badana do livro, editado em 1999.
A outra história sucedeu num evento académico de homenagem a Teixeira de Pascoaes, organizado por António Cândido Franco, Professor na Universidade de Évora, cujo reitor era, à época, outro amigo de António Telmo, o Professor Ferreira Patrício. Cândido Franco tinha-nos convidado, a mim e à Margarida Morgado, como já tinha sucedido em outras iniciativas, para lermos textos do “Verbo Escuro”, creio. Encontrámo-nos, eu e a Margarida, para escolhermos os textos e quem ia ler o quê. Eu escolho um longuíssimo texto que era um elogio ao mar, uma elegia que, lembro, dizia “Ó mar à luz da lua …” Assim que o li, escolhi o tom em que o deveria dizer e não saí dele, tornando-o uma imitação sonora do marulhar do mar, numa nota bem funda, como convinha ao texto. O texto era enorme, a leitura foi monocórdica, a meu ver, e o silêncio na sala foi absolutamente total. Se dormiam todos, nunca o soube bem, mas que seguiam embalados por aquele longo e fundo som, isso pude observar nos olhos de António Telmo e do grupo que o acompanhava. Terminada a função, em conversa com o Telmo, perguntei: «Gostou da leitura?» – Segredou-me ao ouvido: «Cantaste muito bem». Pensando que o meu ilustre amigo não tinha percebido a pergunta, voltei a perguntar, insegura: “Mas li bem?” Obtive a mesma resposta. Compreendi que António Telmo tinha percebido desde sempre o tom menor que eu tinha escolhido para o texto. Fiquei impressionada e encantada. Sempre foi assim, entre mim e António Telmo: uma admiração profunda. Só muito mais tarde, comecei a espreitar e a abrir o véu de alguns dos seus textos.
15-08-2023
DISPERSOS. 20
21-08-2023 00:00À semelhança de “A esfera armilar”, que os leitores de António Telmo bem conhecem das páginas de Filosofia e Kabbalah, “O segredo de Os Lusíadas” surgiu no primeiro número de Escola Formal, revista de que, sob a direcção de Afonso Botelho e Orlando Vitorino, se publicaram seis números, de Junho de 1977 a Junho de 1978, e na qual Telmo publicou ainda diversos outros escritos marcantes, como “Gramática Secreta da Língua Portuguesa”, “O best”, “Mãos e palavras” (depois reintitulado com o seu primitivo subtítulo, “Como a perversão na linguagem leva à demência na sociedade”) ou, então sob o título “Da teologia para a filosofia”, o notável conjunto de aforismos definitivamente conhecido por “Louvor da matéria”.
Com excepção do artigo camonino, todos os textos referidos foram reunidos no já acima mencionado livro de 1989. Note-se, a propósito, que “O segredo de Os Lusíadas” não deve ser confundido com o texto que serviu de base à conferência homónima que Telmo proferiu em 20 de Junho de 1980, no Palácio Foz, em Lisboa, a convite de Afonso Botelho, no âmbito das comemorações do quarto centenário de Luís de Camões, e que figura em Filosofia e Kabbalah. Tal como “A esfera armilar” surge nas páginas de Escola Formal sem estar assinado (um e outro tendo estado omissos, até agora, na bibliografia activa do filósofo), mas a sua atribuição a António Telmo será, por certo, inquestionável. Trata-se apenas de um breve apontamento, porém sinalizando o superior interesse do seu autor por uma temática – o esoterismo de Camões – que praticamente o obsidiará até ao final da vida.
O segredo de Os Lusíadas[1]
Aqui, minha Calíope, te invoco
Neste trabalho extremo por que em pago
Me tornes do que escrevo, e em vão pretendo,
O gosto de escrever, que vou perdendo.
Despertai já do sono do ócio ignavo,
Que o ânimo de livre faz escravo…
Pondo na cobiça um freio duro,
E na ambição também…
e no torpe e escuro
Vicio da tirania infame e urgente…
E dai na paz as leis iguais, constantes,
Que aos grandes não dêem o dos pequenos,
e numerados
Sereis entre os heróis esclarecidos,
E nesta Ilha de Vénus recebidos!
De longe a Ilha viram, fresca e bela.
Dá Veloso, espantado, um grande grito:
«Mais descobrimos do que humano esprito
Desejou nunca; e bem se manifesta
Que são grandes as cousas e excelentes,
Que o mundo encobre aos homens imprudentes.»
Depois que a corporal necessidade
Se satisfez do mantimento nobre,
Tethys, de graça ornada e gravidade,
Pera o felice Gama assim dizia:
«Faz-te mercê, barão, a Sapiência
Suprema de, com os olhos corporais,
Veres o que não pode a vã ciência
Dos errados e míseros mortais.
Segue-me firme e forte, e com prudência».
Não andam muito que no erguido cume
Se acharam, onde um campo se esmaltava
De esmeraldas, rubis, tais que presume
A vista que divino chão pisava.
Aqui um globo vem no ar, que o lume
Claríssimo por ele penetrava
De modo que o seu centro está evidente
Como a sua superfície, claramente.
Uniforme, perfeito, em si sustido,
Qual, enfim, o Arquétipo que o criou.
Vendo o Gama este globo, comovido
De espanto e de desejo ali ficou.
Diz-lhe a Deusa: «O transunto, reduzido
Em pequeno volume, aqui te dou
Do mundo aos olhos teus, pera que vejas
Por onde vás e irás e o que desejas».
O carácter epopeico e patriótico de Os Lusíadas tem iludido historiadores e professores da nossa literatura, que lhe dão a interpretação mais imediata: Os Lusíadas não seriam mais do que a poetização da história pátria e, simbolizado na viagem do Gama, o destino ou a missão dos portugueses estaria todo, como se diz (ou dizia) nas escolas, na descoberta do caminho marítimo para a Índia. Já ironicamente um poeta observou que, descoberta a Índia, os portugueses ficaram sem emprego embora, na conservação do império, ainda tivessem do que, como povo, irem vivendo, ainda tivessem razão para serem povo. Agora, porém, o Império desfez-se, e terá então deixado deter sentido a existência deste povo.
Acontece, todavia, que o vaticínio de Os Lusíadas vai bem mais longe do que «os feitos valerosos» de alguns heróis para «da lei da morte se irem libertando». Não se limitam eles a poetar a história já vivida de um povo, mas vaticinam aquele fim onde reside sua «verdade, condição e destino». A simbólica viagem do Gama não se esgota, não termina, na descoberta da Índia. Alcançada ela, logo o herói a deixa para, já não guiado por deliberação ou prudência humana, chegar onde se diz que «mais descobrimos do que humano espírito desejou nunca? Os versos, extraídos dos cantos IX e X, aí estão para «os que sabem ler».
António Telmo
CORRESPONDÊNCIA. 62
20-08-2023 14:42Carta de Max Hölzer para António Telmo, de 19 de Junho de 1977
Lisboa, le 19-06-77
Cher António Telmo,
Ici les poèmes français.
Je suis content. – malgré tout – d’avoir été chez vous, je vous remercie de toute votre attention et vous prie de dire à votre femme aussi mes remerciements cordiaux.
N’attendez pas trop longtemps pour fixer la prochaine réunion.
Une prière : je voudrais savoir tous les noms des participants (et leur âge, sommairement, sans blancs de discrétion), et l’adresse avec ?, numéro de tél.
Je pars demain, mais j’espère de pouvoir revenir dans un délai pas trop long.
Tous mes vœux, pour vous et votre travail – amicalement
M. H.