VOZ PASSIVA. 123

02-05-2022 16:40

António Telmo, do inesgotável ao infinito

Risoleta C. Pinto Pedro

 

A obra de António Telmo, por conta do trabalho sistemático com a publicação da sua Obra Completa que vem sendo feito pela editora Zéfiro, com a coordenação editorial de António Carlos Carvalho, Maria Antónia Vitorino e Pedro Martins, permite o que não tem acontecido com outros autores: o estudo, a leitura e releitura, e a permanente descoberta de novos textos a partir do espólio. Este ritmo apenas foi atenuado devido à pandemia, mas logo que todas as condições estejam reunidas, sairá o tão esperado XI volume, parado desde 2020 à porta do prelo pelas circunstâncias que todos conhecemos e vivemos. E se uma obra não é inesgotável, não está posta de parte a concretização de, pelo menos, mais um volume, que será o XII. Contudo, este conceito de inesgotável, talvez não coincida com o de infinito. Li, há pouco tempo, que dois infinitos não podem existir juntos, e como não sou matemática, fiquei a matutar no assunto sem sequer tocar na fímbria da questão. Contudo, a minha experiência com os livros de António Telmo, diz-me que uma fonte aparentemente finita pode produzir um infinito, e posso afirmá-lo sem grande hesitação. A obra do nosso filósofo esteve, durante alguns anos, esgotada, mas a reedição acrescida de novos textos permite dispor de uma série de volumes a partir dos quais o estudo pode ser organizado à maneira de cada um. Assim, o meu método é ir relendo os volumes mais antigos. A experiência é a de, se não total novidade, de pelo menos um refrescamento e novas descobertas como se o texto se abrisse a infinitas leituras e releituras. Claro que tal pode suceder-nos com outros livros e autores, mas nunca o experimentei a este nível com nenhum outro.  Isto é sério, mas brincando, posso relacionar este dia 2 do aniversário do ano de 2022 com o oito, ou o mesmo infinito de que falo, e abrindo o volume que estou neste momento a reler, o IV, intitulado Filosofia e Kabbalah, procurando o ponto onde fiquei há dias, e passando para a página seguinte, leio no segundo dos trinta pontos do “Louvor da Matéria”, texto cuja leitura e meditação vivamente recomendo:

«A madeira é o que cresce indefinidamente, é o princípio da multiplicação sem divisão».

Assim sendo, parece-me que dois infinitos não apenas podem coexistir, como podem ser mais, muito mais do que dois. Não significa que eu consiga compreender isto, ou mesmo que seja verdade, mas o meu coração adere a esta realidade que experimenta cada vez que penetra na leitura desta obra magnífica e inesgotável, ainda que o espólio pareça desmentir o que digo.

2 de Maio de 2022