VOZ PASSIVA. 102

18-08-2020 21:28

ANTÓNIO TELMO, DEZ ANOS DEPOIS

 

Trilogia das naus

- Evocação de António Telmo

Uma década de serviço e de saudade

Eduardo Aroso

 

I

Estremoz foi cais de partida.

Dez naus largaram rumo

Ao que se há-de cumprir.

O lugar alarga-o a ideia

O arquétipo do poder-ser.

Dez naus levam a bordo

Pobres franciscanos do universal

Soldados de labuta, seara maior.

Desembainha-se a espada pela luz

Em cada acto eleva-se a espiral

E no meio do «plaino abandonado»

Avistam-se palpitantes cavaleiros do amor.

 

II

As dez naus enfrentam ainda

Precipícios e vagas de nevoeiro.

Multiplicam-se bichos e adamastores

Mas não treme ouroboros

Que permanece sempre inteiro.

O que sobrevive a ventos e marés

São os destinos-alquimias de temores.

As proas cruzam a medonha escuridão

Onde sulcos mostram promessas de azul

Eixos plenos de Oriente ao Poente 

E ao mistério ainda do Cruzeiro do Sul.

 

III

Estremoz foi cais de partida.

Mantinha-se toda a possibilidade

Da rosa ser a seiva da pupila

No rosto com séculos de saudade.

Onde cada um chega encontra

A pedra-angular à sua espera.

E aí seguro edifica seguindo a luz

Que se torna chave das linhas astrais.

Só a palavra livre se conquistou

Perdida e achada, para ser mais.

 

Agosto, 2020