INÉDITOS. 36

19-12-2014 10:18

Escrito no Redondo, no início da década de 70, quando António Telmo ali fundou a Escola Preparatória local, o poema inédito que hoje publicamos foi lido em público, pela primeira vez, pelos Jograis U... Tópico, no passado dia 13, na primeira parte do recital "Os poemas e os poetas de António Telmo", e constitui-se como preciosa peça autobiográfica.

[António Telmo na varanda da Oca, em Brasília, na segunda metade da década de 60]

 

Dostoiewskiana

 

Pus o meu ser no prego

No dia em que arranjei um emprego:

Professor de Filosofia.

A esmola que se dá a um cego

Em paga da luz que não teve ou perdeu

É mais do que a que se me deu

Para não ensinar o que sabia.

Para não ensinar o que pensava

E o que o meu génio me dizia.

 

Aristotélico, pregaram-me à cadeira.

Pitagórico, mandaram-me à fava.

Puseram coisa onde havia ideia.

Epicurista, deram-me um horário

E um reitor felizmente hebdomadário

Arrumado como a página dum jornal.

 

Não faz mal! Não faz mal! Não faz mal!

Se pus meu ser no prego

No dia em que arranjei um emprego,

Se foi essa a minha sorte,

Hei-de levantá-lo

Com o dinheiro da morte.

 

António Telmo